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#180 - EYN Convida: Raphael Dias

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#Edição 180

Raphael Dias (Curitiba, 1986) vive em São Paulo e navega entre a arte visual, a direção criativa e o Acervo Diária, projeto que fundou para celebrar tudo o que nasce do olhar atento. Autodidata, começou pela fotografia, passou pelo desenho e pela colagem, até encontrar na tapeçaria o seu território mais íntimo: onde memória vira matéria e o tempo desacelera, fio a fio. Desde 2020, constrói paisagens imaginadas — e sentidas — que misturam cor, textura e afeto, quase como se bordasse estados de espírito. Em suas mãos, o viver, o habitar e o criar se entrelaçam, fazendo do cotidiano um lugar de poesia e permanência.

Um fio, antes de virar paisagem, é…

textura!

Qual superpoder você gostaria de ter

Teletransporte, pra poder entrar nas paisagens que moram na minha imaginação. Seria uma forma de habitar o invisível.

Um erro que te ensinou mais do que qualquer acerto

Tentar ter controle sobre tudo no processo criativo. Foi justamente quando as coisas saíram do previsto que aprendi a aceitar o tempo das pausas, o valor do incerto. Me ensinou a deixar espaço para o acaso.

Como você acha que a IA vai redefinir o que consideramos “ideia original”

Acho que ainda temos um universo novo para descobrir nesse sentido, mas a distinção da genuinidade me parece começar a ser cada vez mais difícil. Para mim a “ideia original” vai passar a existir mais na intenção, na experiência sensível e no olhar de quem cria. A autenticidade talvez venha menos de onde a ideia nasceu e mais de quem a faz brilhar.

Um livro que vale a pena ler

O caminho do artista, Julia Cameron. Me ajudou a desbloquear ideias e processos.

Uma frase que vale repetir

A estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria.

William Blake

Um conselho que você daria para quem quer viver da arte

Antes de tentar viver de arte, tentar mergulhar em si mesmo o mais profundamente possível. Descobrir o que faz os olhos brilharem. Acredito que o processo e a conexão íntima com a criação vêm antes de qualquer reconhecimento externo, ele é uma consequência natural do trabalho que nasce de um lugar verdadeiro.

Suas tapeçarias costuram passado, presente e imaginação. Em qual tempo você mais habita quando cria?

Sempre medito antes de criar, para tentar navegar nesses três tempos. Me conectar comigo mesmo antes, e habitar o tempo depois. A tapeçaria por si só já é um ofício muito ancestral e muito ligado ao passado. Mas ao mesmo tempo exige muito estar presente. Tento sempre me concentrar bastante no processo, porque sou levado facilmente pelo mundo da imaginação, e é nesse equilíbrio que a obra acontece.

Um prédio modernista que você considera quase um ser vivo

Edifício Capanema, que foi o tema da minha primeira exposição individual

© Oscar Liberal/Iphan

Há algo que você tenta revelar — ou esconder — nas entrelinhas das suas tapeçarias

O sentimento que estou vivendo durante o processo quase sempre encontra um jeito de se manifestar. Às vezes, quero revelá-lo, deixar que ele se transforme em cor e textura, como uma forma de colocar para fora. Outras vezes, uso o processo como refúgio, uma tentativa de esconder algo que incomoda, de esquecer por um instante enquanto produzo. Meu trabalho é muito intuitivo, ele nasce desse diálogo silencioso entre o que quero mostrar e o que quero guardar. Acho que é nesse intervalo que a tapeçaria ganha a força poética.

Um lugar/viagem que te marcou

A residência artística que fiz em junho, no sul da França: La Maison de la Chapelle. Foi um grande marco, tanto na minha trajetória como artista quanto na minha vida pessoal. Estar ali, cercado por uma natureza vibrante, me fez repensar meu próprio processo e o sentido do tempo na criação. Houve algo de muito silencioso e transformador naquela experiência, como se eu tivesse reencontrado um pedaço de mim mesmo.

Uma conta do Instagram que vale a pena seguir

O maior risco que você já tomou na sua trajetória artística

Montar, em apenas duas semanas, uma instalação de tapeçaria sozinho em outro país. Foi um desafio físico, emocional e técnico enorme. Aprender a lidar com o desconhecido, com o tempo curto e com a necessidade de confiar plenamente no meu instinto.

O que você observa primeiro ao entrar em um espaço arquitetônico

O modo como a luz entra. Sempre me chama atenção a forma como ela atravessa o ambiente, desenha superfícies e revela texturas. Citando aqui o livro Em Louvor da Sombra, de Jun’ichiro Tanizaki, onde ele fala sobre a beleza que habita nas penumbras, nas sutilezas que a claridade ocidental muitas vezes apaga. Acho que é isso que busco também: perceber o diálogo entre luz e sombra, entender o que cada uma tem a dizer sobre o espaço e sobre nós mesmos.

Uma referência brasileira que você considera essencial para entender seu trabalho

Niemeyer, a genialidade dos desenhos dele me encantam e influenciam muito.

Uma causa que está em meu coração

A preservação da memória cultural e estética, para que saberes tradicionais e sensibilidades artísticas não se percam na pressa do mundo.

Qual objeto da sua casa você considera muito

Mesas que eram da casa da minha avó, produzidas nos anos 70. Elas me lembram da infância, e também da atemporalidade do design.

Um ritual cotidiano que alimenta seu trabalho artístico

Meditação antes de criar, para gerar um espaço mental.

Como o espaço em que você vive molda o seu olhar?

Gosto de poucos elementos e bastante organização. Meus pensamentos não ficam alinhados se meu entorno está confuso pra mim. Me influencia muito!

O que você gostaria que alguém sentisse ao se deparar com uma tapeçaria sua pela primeira vez?

O despertar de um sentimento de calma, de um abraço. Gosto de pensar que meus trabalhos criam um espaço de pausa.

Se pudesse colaborar com qualquer artista, quem seria — e que paisagem vocês criariam juntos?

David Hockney. Criaríamos juntos uma paisagem inspirada em algum verão passado. Um lugar de luz intensa e memórias difusas.

© Instagram/David Hockney

Um filme que vale a pena assistir

Queer de Luca Guadagnino

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